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A análise exaustiva dos documentos assinalados na denúncia e mencionados por Mário Rocha Lopes, no voto em separado, proporcionou-me conclusões interessantíssimas.
O resumo referente à criação e atuaçao do Partido por la Vitoria del Pueblo -- PVP foi elaborado pela inteligentzia uruguaia, tendo o mesmo ocorrido com o código do partido e um organograma sobre seu funcionamento. Uma parte foi copiada de um livro editado pelo SMACO (Estado Maior Conjunto) cujo título é Testimonio de una naciòn agredida. Quer dizer: o Uruguai continuava a montar quadros artificiais para tirar proveito de suas próprias falsidades.
Os nomes dos ativistas exilados na França, na Argentina e no Brasil eram correios e, num dos dados referentes a Lilian, constava figurar ela em nominata de professores que apoiou o "Grupo 70", do magistério, o qual repudiou o projeto de Lei do Ensino. Esse foi seu grande crime, e também a causa de sua deportação para a Itália.
Sobre Universindo constava:
"8 de outubro de 1971 - integrou uma nominata de pessoas que ocuparam a Universidade da República."
Esse foi o delito de Universindo.
E asseguro com toda a veracidade que tais documentos -- portando o carimbo "Confidencial" -- foram enviados à Secretaria de Seguranca pela Companhia de Contra-Informações, fato que prova o colaboracionismo das forças repressivas dos regimes de "Segurança Nacional" inquistados no Cone Sul.
Contudo, as anotações mais importantes relacionavam-se com Lilian. Uma delas referia que a professora se comunicava, em Paris, com Rubem Prieto e outros, através do telefone 805--8153,
"conforme se vê da cópia da folha de caderneta pertencente a "Maia" (Lilian) e cópia de um fonograma anexo ao documento confidencial."
Essa, entre outras, constitui a prova mais robusta, mais completa, e indubitavelmente irretorquivel. a apontar o DOPS como órgão responsável na articulação do plano de seqüestro.
Efetivamente, em 16 de novembro de 1978. Prieto enviou telegrama solicitando contato urgente. Lilian, já nas mãos de seus captores, que pretendiam pegar outros, foi obrigada pelo DOPS a telefonar a seu companheiro, mas disse-lhe coisas tão estranhas que ele acabou desconfiando. Ela pediu noticias, por exemplo, de Hermann Steffen Aguirre, reclamando que não o via há muito tempo. Mas Prieto sabia que Hermann estivera com ela poucos dias antes, menos de uma semana.
Foi então que decidiu telefonar para São Paulo e para Milão, relatando que algo de estranho estava ocorrendo com Lilian. Milão acionou Montevidéu e São Paulo fez contato com Porto Alegre. A sequência da história é conhecida.
Em vista disso, a conclusão é clara: a cópia da página com esse endereço foi rasgada da caderneta de endereços de Lilian e é documento constante da sindicância às folhas 463.
E agora José??? Qual a desculpa?
Como justificar a juntada de cartas pertencentes a Lilian, bem como manuscritos de Universindo e páginas de endereços das cadernetas de ambos aos autos da sindicância do DOPS?
Estão com a palavra Suas Excelências as autoridades -- o Senhor Ministro da Justiça, o Senhor Governador do Estado, o Senhor Secretário de Segurança,
- pois as autoridades são pessoas honradas . . .
Se disserem que receberam tais documentos dos esbirros do colaboracionismo uruguaio, isso estará longe de implicar uma confissão de sua parte,
-- pois as autoridades são todas pessoas honradas!
Se admitirem que os papéis foram retirados por elas próprias, isso não quer dizer que estejam aceitando a autoria do seqüestro; a Polícia não sequestra, a "Policia prende",
-- pois as autoridades são todas pessoas honradas!
Se afirmarem que tais peças surgiram no processo por geração espontânea, mesmo que a ciência já não cogite dessa hipótese, não estarão raciocinando contra a ciência, mas essa é a mais lógica verdade,
- pois as autoridades são todas pessoas honradas !
E porque mesmo o absurdo acaba reduzido à mais cristalina lógica no Estado Repressivo.
Em Punta Rieles, as condições carcerárias de Lilian eram as mais duras possíveis. Em 2 de novembro de 1980 foi punida com calabozo --solitária. A família ficou impedida de visita-la. Como protesto, decidiu iniciar uma greve de fome no dia l 2, quando se completavam dois anos de seu seqüestro.
Nessa mesma data, em São Paulo e Rio Grande do Sul, realizavam-se atos públicos de solidariedade.
Da. Lília -- que viajara para o Brasil ~ não conseguiu ser recebida pêlos Ministros da Justiça e das Relações Exteriores, fato que deixava clara a negativa de intervenção do Governo brasileiro. Por outro lado, em Buenos Aires o Chanceler Saraiva Guerreiro reafirmava não poder interceder pois, como disse, seria uma impertinência, já que Lilian não é cidadã brasileira, o que fazia seu caso muito diferente do de Flávia Schilling.
Evidentemente as situações de ambas eram diversas. Flávia cumpriu pena no Uruguai porque violara as leis do País. Lilian, ao invés, fora sequestrada no Brasil por expedição militar uruguaia. O caso desta era muito mais grave.
Quanto à possível invasão do território brasileiro -- o que caracterizaria a violação de nossa soberania -- disse o Chanceler que:
"Se houve realmente uma conivência, nesse caso não se configura um atentado à soberania do País, já que os uruguaios teriam sido autorizados a entrarem em terras brasileiras para realizar a operação".
Essa entrevista, concedida a Luiz Martins, enviado especial de "O Globo", é absolutamente incrível. Pois nosso próprio Chanceler estava acobertando crime contra a Segurança Nacional e até justificando a ajuda de nossas autoridades a militares estrangeiros, que constitui crime de traição à Pátria. O Chanceler, sem memória, já não recordava mais aquele chavão:
-- Ame-o ou deixe-o.
Não amou nem deixou. Mas o Chanceler é autoridade. Logo, o Chanceler é pessoa honrada.
Sem esperanças de solução ao seu drama. Da. Lília retornou ao Uruguai e Lilian, após 26 dias de greve de fome, sem qualquer resultado, decidiu suspendê-la.
Em início de janeiro de 1981, a prisioneira saía deprimida da solitária para receber a notícia de que havia sido condenada a cinco anos de reclusão, pena idêntica à de Universindo.
A sentença brasileira que condenou "Irno" e "Didi" fora juntada ao processo da Auditoria Militar, a pedido do Sr. Homero Celiberti.
Como poderia ela ser condenada no Uruguai, se os seqüestradores haviam sido condenados no Brasil? Aí estava uma contradição insuperável a nível do Direito Internacional.
Dessa forma, as injustiças que acompanharam os fatos resultantes da trama brasileira se somaram à injustiça uruguaia, que desabou de modo implacável sobre as cabeças de duas vítimas inocentes.
Estava afinal consagrada a trapaça internacional!
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